A VISÃO DO STJ SOBRE A TEORIA DE IMPREVISÃO NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS

A VISÃO DO STJ SOBRE A TEORIA DE IMPREVISÃO NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS

A teoria da imprevisão diz respeito à possibilidade de ocorrência de fatos novos que não podiam ser previstos pelas partes nem podem ser imputados a elas, os quais trazem reflexos para a execução do contrato. No Brasil, a aplicação da teoria está prevista, em especial, nos artigos 478 a 480 do Código Civil.

Muito conhecida no direito dos contratos, a teoria da imprevisão ganhou novos contornos com o advento da pandemia da Covid-19, quando a crise mundial de saúde afetou gravemente o cumprimento dos acordos.

A imprevisão – e os seus efeitos sobre o contrato – já foi analisada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob diferentes enfoques, como nos contratos administrativos e no direito do consumidor.

Pragas, secas e variações de preço não motivam a resolução de contratos agrícolas

Em 2012, ao julgar o REsp 945.166, a Quarta Turma firmou o entendimento de que não é possível, em decorrência da flutuação no preço do produto agrícola ou dos insumos de produção, ou mesmo diante do ataque de pragas na lavoura – o caso específico tratava da ferrugem asiática –, invocar a teoria da imprevisão para discutir onerosidade excessiva do contrato.

No caso dos autos, o Tribunal de Justiça de Goiás julgou procedente o pedido de um agricultor que pleiteava a resolução do contrato de compra e venda futura de soja firmado com uma empresa. O agricultor sustentava que, devido a mudanças climáticas e pragas, houve elevação dos preços da soja e dos insumos agrícolas.

O ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso, observou que a resolução contratual pela onerosidade excessiva exige a superveniência de evento extraordinário, impossível de antever pelas partes, não bastando alterações que se inserem nos riscos ordinários. Para o magistrado, a presença da ferrugem asiática na lavoura e as variações de preço não acarretam, por si sós, onerosidade excessiva, pois os imprevistos alegados são inerentes ao negócio.

Salomão apontou que as oscilações no preço da soja são presumíveis no momento da assinatura do contrato, visto que se trata de produto comercializado em bolsas de valores e sujeito às demandas de compra e venda internacional. Já a contaminação pela ferrugem asiática também não é fato imprevisível, pois a doença atinge as lavouras do Brasil desde 2001 e, conforme estudos da Embrapa, não há como ser erradicada por enquanto, mas apenas controlada pelo agricultor.

“Para ensejar a aplicação da teoria da imprevisão – a qual, de regra, possui o condão de extinguir ou reformular o contrato por onerosidade excessiva –, é imprescindível a existência, ainda que implícita, da cláusula rebus sic stantibus, que permite a inexecução de contrato comutativo – de trato sucessivo ou de execução diferida – se as bases fáticas sobre as quais se ergueu a avença alterarem-se, posteriormente, em razão de acontecimentos extraordinários, desconexos com os riscos ínsitos à prestação subjacente”, afirmou o ministro.

Revisão dos contratos não é decorrência automática da pandemia

Ao julgar o REsp 1.998.206, a Quarta Turma negou provimento ao recurso especial interposto por uma mãe que pleiteava a redução proporcional das mensalidades escolares de seus filhos e a devolução parcial dos valores pagos durante o período de calamidade pública provocada pela pandemia da Covid-19.

O colegiado entendeu que a pandemia do coronavírus não constituiu fato superveniente apto a viabilizar a revisão judicial do contrato de prestação de serviços educacionais, com a redução proporcional do valor das mensalidades.

O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou que, para a revisão do contrato com base nas teorias da imprevisão ou da onerosidade excessiva, previstas no Código Civil, exige-se ainda que o fato (superveniente) seja imprevisível e extraordinário, e que desse fato, além do desequilíbrio econômico-financeiro, decorra situação de vantagem extrema para uma das partes.

FONTE: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/26032023-A-visao-do-STJ-sobre-a-teoria-de-imprevisao-nas-relacoes-contratuais.aspx